A nova classe C, que viveu nos últimos 15 anos o apogeu do consumo, se vê agora frente à sua primeira crise econômica ao enfrentar alta de preços, aumento do desemprego e oferta de crédito escassa. Diante desse cenário, mais da metade dos consumidores desse grupo (61%) diz estar com o orçamento apertado e declara que compara preços entre produtos e lojas para otimizar o dinheiro, de acordo com pesquisa da Kantar Worldpanel Brazil. Segundo os dados do levantamento, a prioridade ainda é a mesa farta, mas economistas garantem que apesar da mudança de hábitos, o “sonho de consumo não acabou”.
“As pessoas ainda não desistiram totalmente. Elas mudam os hábitos, mas não perdem a referência de consumo, apenas migraram para marcas diferentes. Há casos em que se lavava o carro toda semana e agora só de 15 em 15 dias”, explica o consultor de varejo do Grupo Azo, Marco Quintarelli.
O professor Roberto Kanter, especialista em marketing e varejo da Fundação Getulio Vargas (FGV), concorda. “A curto prazo o consumidor deve priorizar aquilo que faz sentido para ele. Mas tem que ser comedido e qualitativo. O período atual não é para visar quantidade, mas qualidade”, ensina.
Gilberto Braga, professor de finanças do Ibmec-RJ, diz que as pessoas devem começar a rever seus hábitos de consumo, as cestas de despesas e cortar supérfluos para não desequilibrar o orçamento e se endividar. “É preciso comparar preços. Comprar genéricos ou em promoção, repensar a rotina de comer fora de casa e de se divertir em lugares fechados, que são mais caros. Há alternativas como ir passear em locais públicos e receber os amigos em casa”, exemplifica.
Cortar a comida fora de casa foi a primeira atitude de Maria Lucimar Sousa, 54 anos, que está desempregada. “No domingo, fui passear com minhas sobrinhas-netas e levamos o lanche na mochila. Na volta, almoçamos em casa para economizar”, explica ela, que está há dez anos com os mesmos eletrodomésticos e não pensa em trocá-los para segurar os custos. “Não saio mais com o cartão de crédito”, avisa.
Fabiana Pina, de 32 anos, assistente administrativa, conta que passou a ir ao supermercado só de 15 em 15 dias. “Algumas produtos até congelo para durar mais. Aprendi a técnica na internet e funciona bem”, revela.
Grupo deixa de ser grande responsável por venda de carro
A classe C também já deixou de ser a grande responsável pelo crescimento das vendas de carros novos — posto que assumiu por quase dez anos, até atingir o recorde de 3,8 milhões de unidades em 2012.
O presidente da General Motors América do Sul, Jaime Ardila, revela que como consumidora de veículos, a classe C praticamente saiu do mercado<MC0> por falta de condições de comprar um modelo novo. Os motivos da queda da demanda seriam alta dos juros, aumento da inflação e do endividamento.
Segundo o executivo colombiano, as mais de 20 milhões de novas pessoas da classe C foi a fonte fundamental de crescimento da indústria, mas, atualmente, está comprando cosméticos, alimentos – até mudando para marcas mais baratas –, mas ainda não está comprando carros.
Quem tomou a posição de maior consumidora foram as classes A e B. E mesmo estas mudaram de comportamento. De acordo com Ardilla, a venda de modelos mais populares, como Onix e Prisma, estão indo bem. Mas ele acredita muitos desses clientes, em condições normais, iriam comprar carros de maior porte.
O executivo diz que o mercado brasileiro ainda deverá cair 20% em 2015 e só começará a se recuperar no fim de 2016.
Carnê ainda é usado para pagamentos
Apesar de meios eletrônicos para pagamento de contas, o brasileiro ainda lança mão dos boletos bancários e carnês para quitar suas dívidas. Levantamento do Serviço de Proteção ao Crédito (SPC Brasil) aponta que um em cada cinco consumidores usa essas formas de pagamento. O meio mais usado, no entanto, é o cartão de crédito com 52% dos entrevistados colocando os débitos para serem saldados.
A pesquisa revela ainda que eletrodomésticos (44%), eletrônicos (37%), calçados (31%) e roupas (30%) são os produtos mais comprados pela via do crediário. Os consumidores afirmaram que a possibilidade de dividir o pagamento de compras em várias vezes (37%), poder parcelar compra mesmo sem ter cartão ou cheque (14%) e ter prazo para pagamento (13%) são os motivos para pagar no carnê.
De acordo com o SPC Brasil, o crediário é a única forma que a classe C, sem conta bancária e que mora fora dos grandes centros urbanos, tem para conseguir fazer compras de valores mais altos.
Excluindo o cartão de crédito, empréstimo pessoal (37%), consignado (28%), financiamento (22%) e cheque pré-datado (9%) foram citados como forma de pagamento.
(Por O Negócio do Varejo) varejo, núcleo de estudos e negócios do varejo, retail lab, ESPM