A Procter & Gamble Co.  está estudando ampliar o prazo de pagamento dos seus fornecedores, medida que pode liberar até US$ 2 bilhões para o caixa da gigante de produtos de consumo, segundo pessoas a par do assunto.

Ela pode usar o dinheiro para investir em novas fábricas ou recomprar ações. Essa flexibilidade extra, porém, se dará às custas das empresas que fornecem materiais ou prestam serviços à P&G. Elas terão que apertar seu próprio caixa ou assumir o custo dos juros cobrados pelos bancos para cobrir o prazo maior que a P&G usará para pagar suas contas.

A iniciativa demonstra como as maiores empresas americanas continuam a adotar práticas agressivas de gestão de caixa na esteira da crise de crédito. O que começou como uma forma de preservar o caixa em momentos de enxugamento do mercado, há alguns anos, tem se tornado uma maneira de liberar recursos para financiar expansões, recomprar ações e sustentar o pagamento de dividendos em um momento de crescimento medíocre nas vendas e margens de lucro decrescentes.

Na verdade, a P&G está aderindo tarde a essa prática. Ela hoje paga suas contas, em média, em 45 dias, mais rápido que o prazo entre 60 e 100 dias usado por outras empresas, segundo especialistas da indústria. A P&G quer alterar seu prazo de pagamento para 75 dias e já começou a negociar com os fornecedores, disseram pessoas a par do assunto.

Para ajudar os fornecedores a lidar com as mudanças, a P&G está trabalhando com bancos que irão oferecer a eles adiantamento, cobrando uma taxa, após 15 dias, disseram algumas pessoas. As mudanças devem ser promovidas em fases ao longo de três anos e podem atingir centenas de empresas, disseram as pessoas.

Em todos os setores, empresas como DuPont Co. e J.C. Penney Co. estão tentando reduzir a quantia de dinheiro atada às operações do dia-a-dia ao adotar maiores prazos para pagar os fornecedores, recolher mais rápido os pagamentos que têm a receber ou reduzir os custos de produção e de estoque.

As medidas têm gerado efeitos em cascata. Empresas que estiram o prazo dos seus pagamentos estão fazendo com que seus fornecedores passem a ter dívidas que precisam ser financiadas e, como conseqüência, tenham que elevar preços ou pressionar outras empresas ao longo da cadeia. Com isso, pequenas empresas com pouco poder de negociação e menor acesso a crédito podem ver seus custos subirem, tendo que usar recursos que, de outro modo, poderiam ser aplicados em investimentos ou contratação.

Os clientes da Eastek Internacional — fabricante de eletrocardiogramas, monitores para pacientes, fechaduras magnéticas e produtos industriais para terceiros — têm se tornado mais agressivos em relação à extensão dos prazos de pagamento, disse o diretor-presidente Joe Rocco. A empresa agora é paga em uma média de 50 dias. Há seis anos, o prazo médio era 30 dias.

“Isso se tornou um osso do ofício”, disse Rocco, cuja empresa tem cerca de 950 funcionários e operações nos Estados Unidos, Holanda, Hong Kong e China. Agora a empresa está mais cautelosa com relação a contratações e investimentos em novos equipamentos, segundo ele.

Ao alongar seus prazos de pagamento, a DuPont liberou mais de US$ 2,6 bilhões das suas operações diárias ao longo dos últimos quatro anos e pretende conseguir mais. “Você não quer ter dinheiro preso no caixa da empresa sem estar gerando valor algum”, disse Nick Fanandakis, diretor financeiro da DuPont.

A Kimberly-Clark Corp., Church & Dwight Co., Energizer Holdings Inc. e Newell Rubbermaid Inc., concorrentes da P&G, informaram que estão trabalhando com alguns fornecedores para estender os prazos de pagamento e enxugando os processos de fabricação para reduzir os custos de estoques. A Energizer está buscando economizar US$ 200 milhões no seu capital de giro e a Newell, US$ 100 milhões. Elas não informaram o prazo que adotam para pagar suas contas.

“As multinacionais estão tentando se autofinanciar mais porque pegar dinheiro emprestado não será barato sempre”, diz John Ahearn, chefe global de comércio noCitigroup Inc. Ele disse que elas também estão tentando se preparar para crescer quando a economia se recuperar. “Uma vez feitas essas melhorias, elas estão aqui para ficar”, diz Ahearn.

A P&G tem vários pontos de pressão sobre o seu caixa. A companhia, que elevou os dividendos aos acionistas por 57 anos seguidos, está no meio de uma reestruturação de grande escala para reduzir US$ 10 bilhões em despesas até 2016. Logo após ter iniciado o plano de redução de custos no ano passado, a P&G disse que suspenderia seu programa de recompra de ações para manter seu caixa em meio a um cenário de incertezas e para manter sua avaliação de crédito. Depois de ser pressionada por investidores, porém, ela retomou seu programa de recompra de ações, em parte, usando empréstimos.

Os executivos da empresa esperam conseguir financiar as crescentes despesas de capital, assim como a expansão nos mercados emergentes, enquanto continuam a devolver boa parte do lucro aos acionistas e mantêm a recompra de ações. Os cortes de custos e o capital liberado por meio da prorrogação dos prazos de pagamento a fornecedores darão à P&G mais flexibilidade para administrar suas finanças. A P&G gasta hoje mais de US$ 50 bilhões por ano com fornecedores.

O risco de forçar uma prorrogação dos prazos de pagamento dos fornecedores é que isso pressiona financeiramente empresas responsáveis por suprir insumos essenciais. E elas próprias são grandes empregadoras. Insatisfeitas, elas podem passar a trabalhar com concorrentes ou elevar o preço dos seus produtos.

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Muitas grandes empresas “nos procuraram para entender o que pode ocorrer com sua base de fornecedores quando há uma ruptura” e estão procurando formas de ajudar a mitigar os impactos nos fornecedores, diz Michael McDonough, diretor global de cadeia de fornecedores no J.P. Morgan Chase & Co.

Cada vez mais, empresas como a Wal-Mart Stores Inc., Unilever PLC e Kohl’s Corp.  estão trabalhando com bancos para oferecer a seus provedores financiamento barato quando os prazos de pagamento são estendidos. Esses empréstimos, que são opcionais, podem permitir que os fornecedores recebam rapidamente.

Os bancos assumem as faturas, adiantam os pagamentos aos fornecedores e cobram dos compradores na data do vencimento. Alguns fornecedores podem escolher serem pagos no prazo entre cinco a dez dias, apesar de seus clientes levarem até 90 dias para realizar o pagamento.

As baixas taxas de juros no mercado americano tornam o serviço mais acessível. Os bancos agora cobram taxas anuais baixas, que chegam a 1,3%, para comprar os recebíveis de clientes credores de primeira linha, como a P&G.

(Por The Wall Street Journal) varejo, núcleo de estudos do varejo, núcleo de estudos e negócios do varejo