Enquanto os efeitos da recessão e do ajuste fiscal avançam sobre a economia, o pessimismo entre as famílias aumenta, sem distinção de classe. Conforme apontou sondagem da Confederação Nacional do Comércio (CNC), a Intenção de Consumo das Famílias (ICF) caiu 6,9% na passagem de março para abril, com o índice chegando aos 102,9 pontos — o menor da série, iniciada em janeiro de 2010 e o mais próximo da zona desfavorável, abaixo dos 100 pontos. Com menor espaço de manobra no orçamento, as famílias com renda mais baixa, no entanto, são as que mais sentem os impactos da situação econômica adversa.

Entre as famílias com renda de até 10 salários mínimos — equivalente a R$ 7.880 — o índice de consumo atual da CNC está em patamar bastante inferior: 78,4 pontos. Embora também se localize em um nível desfavorável, o indicador de consumo atual das famílias que ganham acima de 10 salários mínimos está relativamente melhor: 85,4 pontos. A diferença de sensação da crise pode ser explicada pela composição do gasto familiar.

De acordo com a Pesquisa de Orçamento Familiar do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (POF/IBGE), 67,5% do orçamento mensal das famílias das classes E e D estão comprometidos com gastos relativos à alimentação e habitação. Entre a classe C, o percentual é de 57,2% . Já nas classes A e B, os gastos com a sobrevivência são menores: 47,9% do orçamento.

“As famílias da classe A têm uma capacidade de ajuste do orçamento muito maior do que as da classe mais baixa, cujo consumo se concentra em bens essenciais”, afirma a economista Ana Maria Bonomi Barufi, do Bradesco . “Enquanto a classe A pode decidir poupar, porque a taxa de juros está mais elevada e, assim, postergar uma compra, ou cortar as idas a restaurantes, que representam quase 50% dos gastos no orçamento, a classe C precisa decidir o que comprar ou não no supermercado”, acrescenta.

Para não abrir mão do que conquistou em termos de consumo, as famílias das classes C, D e E têm lançado mão de estratégias bastante conhecidas: pesquisas de preço, compras coletivas, estoque de produtos não perecíveis e a troca de marcas. É o que aponta o presidente do Instituto Data Popular, Renato Meirelles “A classe C faz economia em itens supérfluos, como iogurte, requeijão e refrigerante. Já a classe A troca de marca de sabão em pó e detergente”, diz.

Mas, diante de uma inflação que acumula alta de 8,13% nos 12 meses até março, segundo o Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA), a busca por ofertas e promoções se tornou também lema das famílias de maior poder aquisitivo. Segundo o economista Christian Travassos, da Fecomércio-RJ, embora as famílias mais ricas primem mais pela qualidade e marca do produto, tem aumentado o percentual de pessoas desse nível social que apontam o preço como um quesito determinante para a compra.

“O freio no consumo, que começou em 2014, permanece nesse início de ano. Itens que não fazem parte do consumo diário e segmentos mais dependentes do crédito acabam sendo deixados de lado, como os produtos da linha branca”, destaca Travassos. Não é à toa que o índice de intenção de consumo de bens duráveis da CNC está em igual patamar para as famílias de menor e maior renda, 79 e 79,4 pontos, respectivamente.

Mas, diferentemente das classes menos abastadas, a classe A tem conseguido tirar proveito da crise, por meio de aplicações financeiras que utilizam o dólar ou a inflação como indexador. “A classe C sairá dessa crise com mais prejuízos, e a A terá ganhos. Cabe ao governo minimizar esse descompasso”, aponta Carlos Thadeu, economista-chefe da CNC.

(Por Brasil Econômico) varejo, núcleo de estudos e negócios do varejo, retail lab, ESPM