As novas demandas dos consumidores revolucionaram a prática do design ao longo dos últimos 40 anos. O Brasil, como um todo, passou, nesse mesmo período, da ditadura para a democracia, do analógico para o digital e da compra habitual em mercados de vizinhança para hipermercados, varejistas com bandeiras internacionais e e-commerce. Todas essas mudanças se refletiram no trabalho de designers, que antes tinham a missão de construir a identidade visual de uma marca, muitas vezes limitada ao logotipo, e agora precisam construir toda a percepção sensorial em torno da companhia, para conquistar o cliente à primeira vista.
O termo design, pouco difundido até a última década, passou a ser sinônimo de status, personalização e exclusividade. Tanto é que outras atividades profissionais, como manicures e esteticistas, também passaram a embutir o nome em suas atividades. Surgiram então, as designers de sobrancelha e as designers de unhas. Todo este glamour, na realidade, tem uma função: agregar percepção de valor ao produto ou serviço. Já no desenvolvimento de itens o sentido vai além, está diretamente relacionado à inovação, diferenciação no ponto de venda e conquista do cliente para a marca.
Os clientes também mudaram, sofisticaram seu consumo e se tornaram mais exigentes. Isto alterou a percepção dos profissionais ao trabalharem com branding. “O briefing antes vinha inteiramente da marca. Os designers por sua vez não gostavam que se metessem nas suas criações. Depois, percebemos que, na realidade, criávamos para os clientes dos nossos clientes e, portanto, a demanda que vinha deles era parte fundamental do projeto”, avalia Gilberto Strunck, CEO da Dia Comunicação, em entrevista à TV Mundo do Marketing.
A importância do PDV para o design
Já que boa parte dos insights vêm dos consumidores, o caminho do desenvolvimento do design tem que obrigatoriamente passar pelo varejo. A intenção é compreender como se dá o pensamento do cliente no momento da compra e assim identificar os pontos que fazem com que ele escolha por um produto ou desista de outro. “Quando entendemos que o design tinha que ajudar a vender, começamos a nos esforçar para entender o consumidor final. Como a maioria dos projetos que fazíamos iam parar no varejo, precisávamos ir até lá e compreender como funcionava a loja”, conta o CEO da Dia Comunicação.
A distância entre o universo das indústrias que idealizam produtos e as gôndolas que os expõem pode gerar ruídos que cancelam os esforços de design. Ainda que a embalagem seja atualizada e exista um trabalho forte de comunicação de massa com relação à determinada linha de produtos, se houverem falhas no PDV ocorrerá uma redução na conversão. “Uma pesquisa do Popai, em 1998, decretou que o índice de influência do ponto de venda na escolha das ofertas é de 85%. A publicidade ajuda a divulgar, mas deve sempre haver preocupação em comunicar com o cara que está em estado de compra”, diz Gilberto Strunk.
A importância do PDV no processo de encantamento do cliente transforma estes espaços cada vez mais em locais de experiência com as marcas. Para isso, as empresas contam com aliados como layout de loja e experimentação dos produtos. A conquista acontece pela junção de todos os sentidos do corpo humano. Grandes redes de supermercados, como o Pão de Açúcar, já contam com lojas de nova geração, com cores e intensidade de iluminação diferenciadas por setor. “O desafio do varejo, em conjunto com a indústria, é criar estes espaços de relacionamento, onde a força de vendas esteja treinada e capacitada para participar deste momento de convencimento de vendas”, avalia Gilberto Strunk.
A jornada do shopper e a chance de encantar
A apresentação dos produtos e a forma como o contato se dá durante as compras é fundamental para conquistar clientes cada vez mais voláteis. A fidelização se torna uma missão mais difícil diante de consumidores que buscam conveniência e estão abertos a novas experiências. “O público está mais informado e dono da decisão. Existem algumas marcas que são como time de futebol e não são trocadas, mas a grande maioria está à mercê de uma decisão de momento”, pontua o CEO da Dia Comunicação.
Em meio a tanto desprendimento, mudanças drásticas de design de uma embalagem, por exemplo, podem ser suficientes para confundir o consumidor e até mesmo anular uma venda. Ainda que a mudança seja um up grade visual, se não vier acompanhada de um bom trabalho de comunicação pode sair pela culatra. “Compramos mais rapidamente os produtos com que estamos habituados. Se muda e ninguém avisa, o cliente fica perdido. Essa é uma excelente brecha para outras marcas se inserirem na cesta de compras”, diz o executivo.
Para acompanhar este consumidor que dá as cartas, as empresas precisam se adequar aos novos hábitos de pesquisa e compra. O comportamento multitela ainda é uma barreira para várias companhias. É comum as pessoas fazerem pesquisas na internet enquanto frequentam uma loja física e o comparativo dos preços pode ser determinante na compra. A expectativa das pessoas é poder interagir com as empresas em seus múltiplos canais de forma integrada. “As lojas físicas são grandes vitrines para a interação com os produtos, um diferencial em relação à internet. Quando o preço online é mais baixo, algumas lojas cobrem a oferta e não perdem o cliente”, conta Gilberto Strunk.
Customização e design andam juntos
O design vai além da aparência dos produtos e pode estar diretamente ligado às suas funcionalidades. É o caso da Nike que disponibiliza em algumas das suas lojas uma análise detalhada da anatomia do pé do cliente para elaborar calçados customizados, tanto no modelo quanto na cor. “A marca tem centenas de tênis, mas as pessoas querem um só seu”, comenta o CEO da Dia Comunicação.
O mesmo raciocínio está presente na indústria de cosméticos. Nos últimos anos a variedade de xampus disponíveis aumentou significativamente. Existem opções para cabelos lisos, crespos, com química e quantos mais a demanda do público solicitar. “Antes, existiam dois produtos, xampu e creme rinse. No futuro, será possível elaborar um xampu para o ‘seu’ tipo de cabelo, a exclusividade ao extremo”, complementa Gilberto Strunk.
(Por Mundo do Marketing) varejo, núcleo de estudos e negócios do varejo, retail lab, EPSM