As gigantes europeias das bebidas alcoólicas estão batalhando para abocanhar fabricantes locais em mercados emergentes, numa corrida pela liderança nas regiões de maior crescimento do mundo.

O valor dos acordos na indústria de bebidas em mercados emergentes tem crescido rapidamente nos últimos dez anos, segundo a firma de pesquisa Dealogic, passando de US$ 3 bilhões em 2001 para US$ 38 bilhões até agora este ano. Com as oportunidades de crescimento na Europa escasseando à medida que a recessão força os consumidores a gastar menos, os fabricantes de cerveja, vinho e destilados estão se voltando para o mundo em desenvolvimento, onde o aumento da renda e da população adulta alimenta a demanda.

Aquisições oferecem às empresas uma porta de entrada para os mercados a um custo relativamente baixo, bem como uma oportunidade para aumentar o fluxo de importações de marcas locais para o Ocidente. E, em mercados relativamente imaturos e fragmentados, ainda há muitos negócios a serem feitos.

No mais recente de uma série de acordos em países de alto crescimento, a italiana Davide Campari-Milano SpA comprou no dia 3 de setembro a fabricante jamaicana de rum Lascelles de Mercado & Co. por mais de US$ 400 milhões. A Campari, que é sediada em Milão e produz a vodca Skyy e o bourbon Wild Turkey, informou que o negócio lhe daria uma posição de líder no mercado da Jamaica, além de uma “massa crítica” nos Estados Unidos, Canadá, México e Caribe.

Em junho, a Anheuser-Busch InBev NV, a maior cervejaria do mundo em vendas, pagou US$ 20,1 bilhões pelos 50% que ainda não tinha da mexicana Grupo Modelo SAB de CV — fabricante da Corona, a cerveja campeã de vendas entre as importadas nos EUA —, cimentando sua presença nas Américas. A empresa de consultoria Ernst & Young afirmou que a transação marcou o retorno dos “mega-acordos”.

Apenas dois meses antes, a InBev havia pago US$ 1,24 bilhão por uma participação majoritária na Cervecería Nacional Dominicana SA, da República Dominicana.

A Diageo PLC, dona da cerveja Guinness e do uísque Johnnie Walker, anunciou no mês passado que estava em negociações com a família Beckmann, do México, para comprar o fabricante de tequila José Cuervo, um negócio avaliado em US$ 3 bilhões. Nos últimos anos, a gigante de bebidas também fez pequenas aquisições na Turquia, na China e no Brasil, comprando bebidas locais em cada mercado — raki, baijiu e cachaça, respectivamente—, como parte da estratégia de gerar metade de sua receita em economias em desenvolvimento até 2015; hoje essa fração é de quase 40%.

A cervejaria holandesa Heineken NV continua travando uma complicada batalha pela Asia Pacific Breweries Ltd., fabricante da cerveja Tiger e uma das empresas de cerveja mais lucrativas da Ásia. No mês passado, a Heineken aumentou sua oferta por toda a participação do conglomerado Fraser & Neave Ltd., de Cingapura, na APB, para US$ 4,5 bilhões, numa tentativa de bater as rivais. Tal acordo daria à cervejaria holandesa uma forte presença no rentável mercado da Ásia.

Tanto a Heineken quanto sua concorrente Carlsberg A/S estão atrás das líderes de mercado AB InBev e SABMiller em termos de rentabilidade, em parte devido à exposição significativamente maior destas aos mercados emergentes. A SABMiller gera cerca de 70% de sua receita no mundo em desenvolvimento, enquanto que a Carlsberg depende da Europa para quase 90% de seus negócios.

Analistas dizem que a tendência reflete uma mudança de longo prazo no poder aquisitivo das economias em desenvolvimento.

Na Índia, cuja economia cresceu 6,9% em 2011, o consumo de álcool deve saltar 45% entre 2012 e 2016, segundo a empresa de pesquisa Euromonitor International.

Os mercados nigerianos e vietnamitas de bebidas estão também entre aqueles com maior potencial de crescimento.

Jonny Forsyth, analista do setor de bebidas para a firma de pesquisas Mintel, diz que as gigantes de bebidas estão implementando uma estratégia de três frentes ao fazer negócios nos mercados emergentes. “A primeira parte [da estratégia] é desenvolver produtos prêmio dentro destes mercados locais”, diz ele, citando a classe média em rápido crescimento no Brasil como um exemplo. “A segunda é melhorar a distribuição nos mercados locais e a terceira é transformar essas bebidas exóticas em produtos para importação.”

O interesse da Diageo na José Cuervo é antigo. Com um acordo de distribuição entre as duas empresas terminando em junho do ano que vem, a empresa britânica não esconde seu desejo de controlar o negócio. “Nós gostaríamos de aprofundar a nossa relação com a família e com a marca”, disse recentemente a repórteres o diretor-presidente, Paul Walsh. “É preciso que ambas as partes estejam dispostas a fazer isso dentro de um contexto financeiro que funcione para os nossos acionistas e para a família. Vamos ver até onde chegamos.”

Com um fluxo de caixa livre de 1,6 bilhão de libras esterlinas (US$ 2,56 bilhões), a Diageo tem muito poder de fogo para mais aquisições, dizem os analistas, mas Walsh enfatiza a responsabilidade e o discernimento.

“[Este é] um negócio que se beneficia dos investimentos que continuamos a fazer, mesmo durante a fase mais dura da crise econômica. Mas só porque você tem um caixa recheado não significa que pode desperdiçá-lo. Somos muito exigentes nas aquisições que fazemos.”

Isso não quer dizer que a estratégia está livre de desafios. A preocupação com uma potencial desaceleração no ritmo de crescimento econômico em países como China e Índia é um tema em debate. Além disso, complexas estruturas regulatórias, protecionismo do mercado local, infraestrutura subdesenvolvida e redes de transportes deficientes podem impedir o investimento estrangeiro.

E, à medida que cresce o interesse das grandes empresas em ativos de mercados emergentes, as gigantes de bebidas alcoólicas acabam pagando caro. “Ativos nos mercados emergentes estão muito procurados e exigindo preços elevados”, diz Andrew Cosgrove, analista da Ernst & Young.

Ainda assim, um banqueiro especializado na indústria de bebidas, falando em condição de anonimato, disse que não prevê nenhuma pausa na atividade de aquisições no mundo em desenvolvimento. Embora os preços dos ativos estejam subindo, disse ele, as grandes empresas ocidentais de bebidas ainda veem valor nesses mercados.

Cosgrove também disse que, mesmo com preços mais altos, as grandes empresas sabem que têm que se envolver.

“Se não pudermos garantir posições fortes nesses mercados, então não teremos quaisquer aspirações globais amanhã.”

(Por Wall Street Journal) varejo, núcleo de estudos do varejo, núcleo de estudos e negócios do varejo