A Amazon, gigante do varejo fundada por Jeff Bezos, anunciou nesta quarta-feira que vai oferecer a entrega em um dia sem custo para clientes do serviço prime. Até agora, o prazo mínimo de entrega gratuita era de dois dias. Para quem não assina o serviço, é possível obter a entrega em 24 horas, mediante custo. O anúncio vem em seguida às divulgações feitas por Magazine Luiza, Mercado Livre e Lojas Americanas de entrega cada vez mais rápida, chegando a ser medida não mais em dias, mas sim em horas.
No fim de julho, inclusive, a briga entre Magalu e Meli ficou tão acirrada que foi parar no Conar. De acordo com a decisão do órgão, a companhia fundada por Luiza Trajano tem o direito de intitular em suas propagandas que tem a entrega mais rápida do país.
Enquanto isso, a Amazon segue um caminho diferente. Com mais cautela do que as concorrentes — que têm pontos físicos de distribuição espalhados pelo país –, a gigante americana preza mais pela confiança do que pela disputa imediata por rapidez.
“Nosso foco é entregar a melhor conveniência para os nossos clientes. Entregamos na casa deles, porque essa é a necessidade que reconhecemos deles”, diz Mariana Roth, diretora do Amazon Prime no Brasil.
A partir deste mês, clientes em cinquenta cidades poderão contar com o benefício de entrega em um dia sem custo de frete — entre as mais de 700 atendidas pela companhia hoje.
A expansão do serviço de entrega gratuita para esses locais está ligada, principalmente, ao aumento da capacidade logística da empresa: dos nove centros de distribuição que a Amazon tem atualmente no país, quatro foram lançados em 2020. Algumas das cidades contempladas são Recife, Porto Alegre, Brasília e São Paulo.
Ao todo, são mais de 40 categorias comercializadas pela varejista, tanto de produtos próprios quanto do marketplace. Entre os milhares de produtos, até mesmo itens de supermercado são vendidos na plataforma, com exceção de produtos frescos.
Mesmo com uma grande quantidade de categorias e a entrega para 700 cidades, a empresa ainda não comenta a respeito de possíveis pontos físicos de retirada de produtos — ou mesmo lojas que poderiam funcionar como mini centros de distribuição.
É algo diferente da operação dos Estados Unidos, em que há lockers nos quais é possível retirar compras feitas pelo site, por exemplo. Eles estão espalhados em mais de 900 cidades nos Estados Unidos, em espaços como shopping centers, condomínios e supermercados.
Além disso, em 2018, a companhia também investiu em pontos físicos com a abertura do Amazon Go e, no ano passado, anunciou a intenção de expandir esses pontos com o Amazon Go Grocery — que passaram por ajustes em sensores e câmeras em 2020.
Isso sem mencionar a compra da Whole Foods, há pouco tempo, por US$ 13,4 bilhões. Em suma, movimentos para se fazer mais presente no dia a dia de consumidores também no mundo físico.
Estratégia para brigar com empresas locais?
Enquanto isso, o Brasil segue um caminho diferente dentro da estratégia da Amazon. A gigante apresenta avanços mais “controlados” em um ambiente no qual consumidores têm familiaridade com marcas nacionais — sem mencionar o fato de que as empresas locais conhecem as dificuldades logísticas do país.
Com a premissa de não frustrar consumidores com prazos de entrega, somada ao investimento em tecnologia, a empresa parece querer entender melhor a dinâmica local antes de dar passos maiores, seja no mundo físico ou no virtual.
“O jeito que o Brasil opera pode ser uma dificuldade para empresas estrangeiras. Basta lembrar que o Walmart, gigante consolidado nos Estados Unidos, foi embora do Brasil há pouco tempo. Isso sem contar no empecilho do reconhecimento de marca ante empresas nacionais”, diz Maurício Morgado, coordenador do Centro de Excelência em Varejo da FGV.
Isso não significa que todos tenham um destino como o do Walmart. Basta lembrar que o Mercado Livre é uma empresa argentina — e cuja presença no Brasil se estende há mais de vinte anos, não custa lembrar. De um site onde era possível comprar um pouco de tudo, tendo certa desconfiança, ao gigante do e-commerce brasileiro, a companhia mostrou que tempo e investimentos na logística local podem ser um santo remédio.
Em números, as vendas no Brasil cresceram 84% no primeiro trimestre de 2021 em relação a 2020. Além disso, em março, a companhia anunciou que vai investir R$ 10 bilhões no Brasil em 2021, um montante similar ao que foi investido nos últimos quatro anos. Hoje, o Meli tem 610 mil metros quadrados em infraestrutura, aumento de mais de 300 mil ante o que tinha em 2020.
O principal objetivo é um só: se tornar competitivo em entregas cada vez mais rápidas para os consumidores. Essa é uma vantagem cada vez mais valorizada na hora de comprar online — e, diante do desafio de não ter lojas físicas, fica fácil entender o investimento da empresa em frota própria de entregas — com até aviões próprios–, além dos centros de distribuição.
No cenário brasileiro, a empresa representa a competição direta com a Amazon, justamente por isso: ambas são o que, no jargão, se chama de pure play (totalmente digitais) enquanto Magalu, Via Varejo — que passou por transformações importantes recentemente — e Lojas Americanas atuam de forma omnichannel (com lojas físicas e operação digital).
Nesse caso, o Magalu parece estar à frente. Com 1.300 lojas (e planos de expandir esse número para 11.683 nos próximos três anos), a empresa fez com que o faturamento da operação de e-commerce crescesse mais de 110% no primeiro trimestre deste ano em relação ao mesmo período do ano passado. O aumento fez com que 70,3% das vendas totais da companhia fossem realizadas on-line.
O que o futuro reserva?
Mas, isso não significa que a Amazon possa ter “perdido o bonde” do crescimento. Muito pelo contrário.
“A Amazon enfrenta vários obstáculos no Brasil. Adaptação de sistemas para a renda local, dificuldades logísticas, com infraestrutura de estradas por vezes precária. Além disso, entregas em regiões mais distantes poderiam exigir repasse de custos para o consumidor, ou investimentos muito mais pesados em logística. Sem falar nas autorizações para trabalhar em determinados locais e na busca por galpões próximos aos grandes centros urbanos”, afirma André Dias, diretor de métricas da Associação Brasileira de Comércio Eletrônico.
Dentro desse cenário, há espaço de sobra para a Amazon se desenvolver. O e-commerce atualmente representa cerca de 10% de todas as compras feitas no país — e a empresa está longe de precisar de caixa. No segundo trimestre deste ano, a companhia lucrou US$ 7,8 bilhões. Apesar do resultado estar abaixo do esperado por analistas, representa evolução de 27% nas vendas em relação ao mesmo período de 2020.
No caminho para consolidar a presença no país, algumas alternativas podem se apresentar. Aumentar parcerias para a entrega e investir em centros de distribuição são as mais óbvias, por assim dizer. Parece mesmo que o importante, para a Amazon, é consistência — mais do que a rapidez de seus concorrentes. Nos Estados Unidos, a predominância da empresa é incontestável, mas no Brasil, parece que será necessário esperar alguns anos para ver o verdadeiro resultado.
(Por Exame – Karina Souza)
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