São seis da tarde de uma segunda-feira, as lojas do shopping recebem poucos clientes e o mall aparentemente está vazio. No entanto, na área de recreação, localizada no centro da praça de alimentação, crianças brincam com monitoras, sob o olhar atento dos pais. Nos cafés, o movimento também é razoável. Mas é na zona Gourmet que este shopping center fervilha, com restaurantes cheios e poucos lugares vagos nas mesas do terraço aberto, voltado para um belo jardim. Parte dos frequentadores desse terraço é de empregados das empresas localizadas nas duas torres comerciais erguidas ao lado do mall.
Situações parecidas com essa acontecem frequentemente em shoppings de norte a sul do Brasil e refletem uma nova realidade: a vocação desses espaços mudou um bocado desde que surgiram no país, 50 anos atrás. Os templos de consumo viraram locais de convivência onde faz-se de tudo – até compras.
Vale lembrar que o fenômeno não ocorre exclusivamente por aqui. Também nos Estados Unidos, berço do shopping center moderno, as pessoas estão usando esses locais para trabalhar, divertir-se, fazer exercícios, marcar consultas médicas, encontrar amigos, comer ou morar. Tudo junto e misturado. Neste novo cenário, a ordem para atrair fluxo é multiplicar as motivações de visita, criando um polo de alta atratividade.
A expressão que o segmento de shopping center começa a adotar mais intensamente para definir essa estratégia, que envolve desde investir forte em eventos até promover mudanças no tenant mix, incluindo lojistas orientados para serviço e experiências, é ‘placemaking’. A ordem é atrair as pessoas e fazê-las ficar mais tempo no mall. A beleza dessa ideia é que quanto mais gente aparece, mais outras pessoas vão também querer estar ali, para verem e serem vistas em um local concorrido.
Você pode estar perguntando-se: afinal de contas, atrair fluxo e fazer as pessoas passarem mais tempo no mall tem sido há muito tempo a principal tarefa da área de marketing dos shoppings. Qual a novidade? Bem, para começo de conversa, é preciso assumir que um crescente número de clientes irá ao shopping não pelas compras, e sim, para divertir-se, socializar ou simplesmente passar momentos agradáveis. Isso afetará a maneira como serão desenhadas e conduzidas as estratégias de tenant mix, eventos e conversão.
Bom exemplo da mudança em curso no mix de lojas é a previsão da GGP, uma das mais importantes empresas de shoppings dos Estados Unidos, de que apenas 25% (em ABL) das negociações para futuras locações serão para lojas de vestuário. Em 2015, esse índice era 50%. Ao mesmo tempo, operações de comida, que concentravam 11% das negociações, devem dobrar para 22%. Mas não pense na antiga praça de alimentação de anos atrás. Novidades, como os Food Halls e locais que oferecem melhor experiência, como restaurantes, casual dining e fast casual, estão pipocando por toda a parte pela capacidade de atrair pessoas em busca de socialização e diversão. Academias, clínicas de estética, consultórios médicos, universidades, cursos de inglês e espaços de co-working são outras operações também capazes de ajudar a construir o conceito de placemaking.
Ao mesmo tempo, os eventos devem ser pensados de uma maneira diferente, tendo em vista diversos segmentos que, juntos, compõem o público frequentador do novo shopping center: donos de cães (que são por eles tratados como filhos), pais de crianças pequenas, amantes de motocicletas, defensores da natureza, esportistas e por aí vai. Para cada um deles deve haver uma atração relevante, capaz de fazer com que se animem a sair de casa em direção ao shopping.
A estratégia de placemaking exige ainda que o ambiente favoreça o alongamento da permanência do cliente, proporcionando conforto e conveniência. Lounges agradáveis, com tomadas para carregar celulares, bom paisagismo, cafés, mesas para trabalho ou estudo, banheiros com nível de hotéis 5 estrelas são algumas das características que devem marcar os novos centros. Shoppings americanos que passam por revitalizações, como, por exemplo, o Westfield Century City, em Los Angeles, tem investido fortemente nestes diferenciais.
Com tudo isso, como ficam as vendas nas lojas tradicionais? Estimular os varejistas a também promover experiências e envolvê-los nos eventos será essencial, bem como investir em novas formas de conversão, tais como ações dirigidas a setores específicos e cuponagem virtual. Tudo com o objetivo de turbinar compras não planejadas.
Por tudo isso, fique certo: placemaking não é apenas um conceito que está na moda. A arte e ciência de criar lugares onde as pessoas queiram estar e encontrar outras é simplesmente a chave para a transição dos shopping centers na direção do seu futuro.
(Por Mercado&Consumo) varejo, núcleo de varejo, retail lab, ESPM, Shopping Center