No último andar de um dos shoppings mais luxuosos do país, o Cidade Jardim, na capital paulista, uma pequena banda improvisada com funcionários da varejista Daiso Japan tocam uma música japonesa, cuja letra, embalada pela melodia triste, ecoa alto por toda loja.

À frente do grupo, com os olhos marejados de orgulho, o diretor-presidente da companhia no país, o engenheiro japonês Keisuke Ono, canta alto o refrão que ele traduz como “brindemos juntos no palco da vida”.

“Estou muito feliz por esta nova loja e toda nossa trajetória no Brasil”, diz o principal executivo da empresa japonesa durante a inauguração da unidade, em março. “Não foi nada fácil até aqui”, admite ele, com um português perfeito de quem vive no país há quinze anos.

Ao seu lado, tocando violão e puxando o coro, o gerente geral da rede, o paulistano Reginaldo Gonçalves, canta alegre a canção, a mesma sempre entoada pelos funcionários a cada novo endereço.

“Passar por dificuldades nos uniu como a uma família”, diz ele, referindo-se à equipe de 300 pessoas que trabalham para a companhia atualmente.

Não é mais preciso treinar a letra da canção, todos já a conhecem de cor: a loja do Cidade Jardim é a 31ª unidade aberta desde a chegada da rede ao país, em 2012.

No entanto, ela destoa das demais pelo tamanho maior, de 260 metros quadrados, e a decoração composta de prateleiras de madeira e iluminação LED, além de produtos exclusivos.

A essência, ainda assim, é a mesma dos demais espaços, repletos de gôndolas com itens pequenos e coloridos, tão díspares quanto um porta-cartão e uma tigela de bambu, a preços que vão de 7,99 a 49,90 reais.

“Queremos que essa seja modelo para as dez lojas que queremos abrir por ano até 2020”, explica Ono. “Nada mal para quem começou sozinho, não?”, questiona satisfeito.

Para 2017, em particular, o plano é ainda mais ambicioso – serão 20 novas unidades. Cinco delas, incluindo a do Cidade Jardim, já foram abertas desde o início do ano.

Turbilhão inesperado

Ono trabalhou anos como presidente de empresas japonesas no Brasil antes de aceitar o desafio de começar os negócios da Daiso no país, há cinco anos. Topou pelo desafio que, até então, parecia quase impossível, de conquistar os brasileiros com bugigangas do Japão.

Depois de pesquisar bastante, concluiu que o endereço ideal para a abertura da primeira unidade seria a rua Direita, localizada em meio ao caos do centro da capital paulista. Com ele, apenas uma secretária, mantida até hoje, e um pequeno orçamento para a empreitada.

O tino para o comércio e a fluência em japonês, adquirida nos 20 anos em que Reginaldo viveu no Japão, fez com que o terceiro funcionário da loja virasse gerente geral em três meses.

Pouco tempo depois, em março de 2013, já com uma equipe um pouco maior, o primeiro desafio da Daiso veio como um turbilhão inesperado. Produtos foram saqueados enquanto a loja era depredada durante o primeiro grande protesto na cidade daquele ano.

O parco recurso que sobrou, entre estoque e caixa, abasteceu o ânimo dos funcionários para reerguer a loja, à beira da falência. Foi a primeira vez que, juntos, cantaram a canção japonesa, que viraria marca registrada da equipe nas futuras inaugurações de unidades.

“A força que precisamos ter para começar do nada nos deixou unidos, mais focados em fazer a empresa crescer”, lembra Gonçalves. “Deu certo”.

Página virada na Daiso

O crescimento veio – e rápido. O faturamento da rede saltou de 60 milhões de reais, em 2015, para 100 milhões de reais no ano seguinte, com a expectativa de superar 200 milhões de reais até dezembro.

O incremento veio com o maior volume vendido ao passar dos anos, já que o valor médio gasto pelos clientes nas lojas segue o mesmo, desde o início da operação: 35 reais por pessoa.

Entre os itens mais vendidos, um pouco de tudo. Para se ter ideia, a cada três segundos uma gravata e um par de cílios são vendidos por uma Daiso no país.

O número é compreensível quando se considera a variedade dos produtos da varejista. A cada mês, um comprador da loja encomenda 200 peças de produtos importados do Japão para o Brasil, por meio de um catálogo mundial da Daiso – o equivalente a um container por mês.

Todo o estoque dura, no máximo, três meses e a velocidade de vendas de cada item serve de termômetro para novos pedidos.

“Erramos muito no começo e erramos até hoje”, conta Ono. Questionado sobre o erro mais grotesco da loja ao comprar um item, ele não tem dúvida. “Uma luva que vai até o ombro, muito usada por japoneses que querem evitar sol ao dirigirem, não fez sucesso nenhum no Brasil e está encalhada até hoje”, responde, bem-humorado.

Para a loja do Cidade Jardim, a expectativa da empresa é maior em relação às demais. A meta é fazer com que o tícket médio da unidade seja de 50 reais. Tudo para compensar o investimento maior no endereço, de 1,5 milhão de reais.

“Queremos vender bem não Cidade Jardim quanto na internet e na Rua Direita, sem deixarmos de lado a personalidade da marca”, conta Reginaldo.

Além do país, a Daiso vem traçando planos para crescer também em outros países, como Tailândia e China, enquanto firma os pés no Japão como a maior varejista do país.

Enquanto os consumidores compram seus itens baratos e superficiais em uma de suas 4.000 lojas pelo mundo, a rede já construiu um império de 3,4 bilhões de dólares.

(Por Exame) varejo, núcleo de varejo, retail lab, ESPM