A perda da renda e o medo do desemprego têm derrubado as vendas do comércio, mas itens como roupas e calçados estão sendo especialmente afetados, por não serem de primeira necessidade. Neste cenário, a inflação do vestuário tem sido sistematicamente menor que a taxa geral no país. Em 2015, o Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) foi de 10,67%, mas os preços de vestuário e calçados só avançaram 4,46%.

O movimento dos preços reflete parte da estratégia dos varejistas para enfrentar uma crise que já completa 16 meses de quedas seguidas nas vendas de roupas e calçados. O tombo foi de 12,9% no primeiro trimestre do ano, o pior desempenho desde 2000. Liquidações passaram a ser quase permanentes, e o comércio corta margem de lucro para conseguir vender e diminuir as perdas. A tática de sobrevivência também inclui renegociação com os fornecedores, estoques menores, parcelamentos mais longos para o consumidor e demissão de funcionários

COMÉRCIO NÃO TEM ESPAÇO PARA REPASSAR PREÇOS

Ao percorrer ruas de comércio de bairros como Copacabana, Ipanema e Madureira, são muitas vitrines vazias, com cartazes de vende-se ou aluga-se. Quem está com as portas abertas, muitas vezes, tem dívidas com os bancos e atrasa o pagamento de impostos e de salários. Até mesmo um comportamento que era pouco tolerado pelos comerciantes começa a virar rotina: vendedores sentados durante o horário de trabalho.

— O varejo não tem espaço para repassar preços. Desde 2014, temos uma diferença grande entre a inflação geral e a inflação do vestuário. O varejo acaba apelando para liquidação o ano todo — afirma o economista sênior da Confederação Nacional do Comércio (CNC) Fabio Bentes.

Foi justamente essa a estratégia adotada na ACR Fashion, em Madureira. Segundo a gerente Adilene da Silva, todas as peças na loja chegaram há, no máximo, um mês. E já foram para as araras com preços promocionais.

— Essa é a coleção nova. As calças que saíam a R$ 65, por exemplo, estão custando R$ 50. Quem tem preço mais alto não vende — diz Adilene.

QUASE 1.500 LOJAS FECHADAS NO ESTADO

Ao recorrer a essas alternativas, os empresários tentam evitar o mesmo destino de 17.400 lojas de vestuário e calçados que fecharam as portas em todo o país no ano passado, segundo levantamento da CNC. Ao todo, o comércio nacional perdeu 95.400 estabelecimentos. Apenas no Rio de Janeiro, foram 7.430 lojas fechadas, das quais 1.428 de vestuário e calçados.

Os mais vulneráveis nesse momento difícil do setor são os pequenos lojistas. Proprietário da Aletex Magazin, Ali Kalil Charif ainda lembra dos tempos áureos da Avenida Nossa Senhora de Copacabana, nos anos 1960, quando comprou a loja. Mais conhecido como Seu Elias, o sírio naturalizado brasileiro hoje acumula prejuízo, está com o pagamento do IPTU atrasado e não tem conseguido pagar em dia o salário das funcionárias.

— Tenho seis vendedoras, mas não há movimento nem para duas. Só não mando embora porque estão comigo há muitos anos. Se eu pagasse aluguel, já teria quebrado. Se alguém quiser comprar, não penso duas vezes — desabafa.

Durante quase uma hora, na manhã da última terça-feira, não entrou uma única pessoa na loja. No fim da tarde, ele costuma liberar parte da equipe mais cedo, diante do pouco movimento:

(Por O Globo) varejo, núcleo de varejo, retail lab, ESPM