Com uma das maiores posições de hedge cambial entre as empresas não financeiras, a JBS deverá gerar mais caixa com os contratos usados para se proteger contra a desvalorização do real do que com suas operações de carnes bovina, suína e de aves somadas.

Com a queda de 35 % do real frente ao dólar, o lucro da JBS com os chamados derivativos cambiais deve atingir a marca recorde de R$ 15 bilhões em 2015. Embora tenha dado certo até aqui, a estratégia tem seu risco.

Se a companhia tivesse sido pega na contramão do mercado, com uma abrupta valorização da moeda brasileira, as perdas poderiam ter consumido boa parte de suas reservas de caixa.

A JBS é mais conhecida no exterior como a empresa que adquiriu a Pilgrim’s Pride, entre outras grandes empresas, em uma série de aquisições que já somam mais de US$ 20 bilhões na última década. Mas nos círculos financeiros essas apostas cambiais renderam outro apelido à empresa: o fundo de hedge que vende carne.

O que chama a atenção na posição de derivativos da JBS não é simplesmente o tamanho — cerca de US$ 12 bilhões em apostas contra o real –, mas também a lógica por trás da aposta.

A JBS diz que está simplesmente se protegendo contra a desvalorização cambial, que aumenta o valor de sua dívida em dólares quando convertida para reais. Para alguns observadores externos, trata-se de um movimento exagerado, considerando que a empresa obtém mais de 80% de suas receitas em moeda forte — uma espécie de hedge natural, que anularia o impacto do câmbio sobre a dívida externa.

Para alguns analistas, o tamanho do programa de hedge da JBS sugere a existência de um componente especulativo na estratégia.

“Parece uma estratégia agressiva”, disse Viccenzo Paternostro, analista do Credit Suisse, de São Paulo. “A JBS possui muitos ativos em dólar e grandes operações nos EUA, na Europa e na Austrália. Não precisaria fazer hedge de tudo em dólares. Poderia fazer hedge apenas da dívida que está no Brasil”.
Os irmãos que controlam a empresa, Wesley e Joesley Batista, ganharam nome apostando alto, muitas vezes assumindo empresas deficitárias e acumulando dívidas, enquanto transformavam o abatedouro aberto pelo pai na maior produtora de carnes do mundo.

‘Longa jornada’

Em entrevista concedida em maio na sede da empresa em São Paulo, Wesley Batista, o CEO da JBS, fez uma previsão reveladora da estratégia da empresa. Enquanto os analistas projetavam que o real cairia apenas mais 6% até o fim do ano, Batista afirmava que a processo de desvalorização da moeda estava “apenas no começo”.

Nos bastidores, a JBS estava perto de completar um aumento de quase 50 % em sua posição de derivativos, na comparação com dezembro de 2014.

Desde a entrevista, o real caiu mais 26% em meio ao agravamento da recessão, à queda nos preços das commodities e a um escândalo de corrupção que deixou a presidente Dilma Rousseff em situação política delicada.

Enquanto isso, as ações da JBS subiram 49 % neste ano, um raro ponto de luz em meio à crise do mercado brasileiro.

A JBS está gastando cerca de R$ 4 bilhões em juros para carregar seus derivativos — duas vezes tudo o que lucrou em 2014, estimam analistas do Credit Suisse e do Bradesco BBI. Sua posição inclui US$ 5,5 bilhões em contratos futuros negociados na bolsa de São Paulo — quase o dobro da posição que mantinha no fim de 2014 — e cerca de US$ 6,3 bilhões em contratos a termo, operados em mercado de balcão.

“Definitivamente não acreditamos em hedges naturais porque não se pode garantir que as receitas e as margens continuarão constantes em dólares”, disse o diretor financeiro da JBS, Jerry O’Callaghan. “Nós consideramos que nossa estratégia é prudente e de nenhuma maneira especulativa”.

(Por Exame) varejo, núcleo de estudos e negócios do varejo, retail lab, ESPM