A crise econômica no Brasil chegou para acelerar as transformações pelas quais a indústria de shopping centers já começava a experimentar, embora ainda de forma tímida. Mais do que nunca, a conveniência de comprar sem sair de casa – que gera uma economia importante em tempos de recessão, por conta da redução nos custos extras, como lanches e estacionamento – reforça a instabilidade no setor e exige dos centros comerciais um novo posicionamento.
As vendas totais em shoppings caíram 5,5% em julho deste ano, em relação ao mesmo mês de 2014, enquanto o e-commerce cresceu 11,5%, comparando o mesmo período, segundo relatório da MasterCard SpendingPulse. O dado reforça que o consumidor ainda tem a aspiração em gastar e que, aos poucos, está experimentando novos canais. E é neste ponto que os gestores de shoppings devem ficar atentos, oferecendo novas experiências para atrair um público que está cada vez mais exigente.
Na ominiera, o que se espera é que os shoppings estejam cada vez mais integrados a ações digitais, eliminando possíveis barreiras que possam existir entre o físico e virtual. “Cada vez mais vamos perceber o aumento do modelo de loja fullfilment, em que ao mesmo tempo será ponto de venda, lugar onde as pessoas buscam o produto, área de distribuição, showroom e suporte para as vendas iniciadas pela internet. O varejista deverá se adequar a essa nova realidade, uma vez que, mesmo optando muitas vezes pela compra online, o consumidor também quer passear no shopping”, explica o especialista em shopping centers e varejo, Michel Cutait, Diretor da consultoria Make it Work, em entrevista ao Mundo do Marketing.
Um objetivo e inúmeras ferramentas
Essa mesma tecnologia que encurta processos e facilita o dia a dia também é responsável por influenciar comportamentos que podem impactar no modelo de compra que vemos hoje. Uma das características encontradas nas novas gerações é a falta de interesse pelo contato físico, o que pode influenciar no momento da compra. Sem paciência para negociações, os millennials, por exemplo, preferem adquirir produtos pela internet e buscá-lo na loja, que pode estar no caminho dele, sem que seja necessário esperar pela entrega em casa. Além disso, há ferramentas como beacons, aplicativos, câmeras inteligentes, etiquetas RFID, pagamento via mobile e outras tecnologias que se aplicam ao varejo.
Outra forte tendência é o fim dos check-outs, que agilizará a rotina dos consumidores cada vez mais impactados pelo aumento da sensação de urgência. Em abril desde ano, a Via Varejo, detentora da rede Ponto Frio, passou a testar o pagamento mobile nas lojas físicas. Com iPads, os vendedores ficaram responsáveis por finalizar a venda, eliminando a necessidade de se enfrentar filas. “Essas iniciativas acabam com a percepção negativa que o consumidor tem quando entra em uma loja e vê uma enorme fila no caixa. Com uma medida simples, é possível melhorar a experiência de compra e mostrar para o consumidor que você valoriza o tempo dele”, acrescenta Michel Cutait.
Se os novos processos podem afastar o consumidor do ponto de venda físico, eles também podem ser responsáveis por atrair esses mesmos clientes com ofertas de novas experiências. “Em um ano em que há um pessimismo generalizado, o nosso papel é mudar essa expectativa para provocar uma mudança de comportamento. Mas não é só o atual cenário que impacta nas vendas. Além da desaceleração da economia, percebemos que os consumidores também estão mudando por conta do e-commerce. A internet transformou o cliente, que já chega nas lojas sabendo realmente o que quer”, acrescenta Laureane Cavalcanti, Gerente de Marketing Corporativo da Sonae Sierra Brasil, em entrevista ao Mundo do Marketing.
Jornada de compra antes de sair de casa
Atenta a essa nova fase do consumidor, desde 2011, a Sonae Sierra Brasil tem olhado para a internet com bastante atenção e estudado possibilidades de ações digitais para impulsionar as vendas e fazer com que os corredores dos seus 10 shoppings espalhados pelo país estejam sempre movimentados. Após profunda análise de como deveria ser feito esse posicionamento, a companhia desenvolveu o Digital Experience, que desde 2013 passou a ser implantado gradativamente. A primeira fase do processo foi definir a presença digital de cada shopping, construindo um posicionamento estratégico de acordo com as características regionais dos equipamentos.
Naquela ocasião, há dois anos, manter apenas o site não era mais suficiente para atender as demandas, e as redes sociais foram fundamentais para abrir um diálogo com os consumidores e estimular as vendas. Com o canal consolidado, a companhia percebeu que era necessário oferecer ferramentas que oferecessem maior comodidade aos clientes. Com isso, surgiu o “Consultor WhatsApp”, que permite que os clientes tirem dúvidas, comentem sobre serviços e compra de produtos, antes, durante e depois da visita aos shoppings.
Há ainda o “Compra Junto”, que funciona como uma consultoria personalizada. Por meio de canais digitais – WhatsApp, site e redes sociais – os consumidores podem tirar dúvidas sobre lojas, produtos e fazer reservas, deixando a visita ao ponto de venda apenas para o pagamento e retirada do item. A inovação começou a ser testada em um projeto piloto por conta do Dia dos Pais.
Outra ferramenta é o “Chega de Fila”, aplicativo que agiliza o cadastro de cupons fiscais para participar de promoções. O APP já teve mais de nove mil downloads e tem papel importante para o Marketing dos shoppings. “Acabou a visão de que quanto mais tempo o cliente passa dentro do shopping, mais ele gasta. O tempo do consumidor tem que ser respeitado. Com a ferramenta que simplifica todo o processo e que pode ser usada de qualquer lugar, estimulamos os consumidores a participarem das nossas promoções, o que ajuda a justificar os investimentos, já que reduz o custo por pessoa. Além disso, é possível enxugar também o custo com a contratação de equipe para fazer o cadastro presencial. Apenas no Boulevard Londrina, nas promoções de Dia das Mães e Dia dos Namorados, 68% das trocas de notas fiscais foram realizadas pelo aplicativo e pelo site”, comentou Laureane Cavalcanti.
Grupo Partage amplia investimentos em Marketing
Para encarar o desafio de estimular o consumo e atrair o público para seus empreendimentos, o Grupo Partage resolveu ampliar em cerca de 40% os investimentos em Marketing para o segundo semestre. Com um portfólio formado por seis empreendimentos em operação e três em estruturação, a companhia está presente, principalmente, em cidades em desenvolvimento no interior do pais, oferecendo produtos e serviços para os consumidores das classes B e C.
O incremento na verba será destinado para a realização de eventos que ofereçam entretenimento para levar toda a família para os equipamentos. A iniciativa visa atrair os consumidores que estão diminuindo a frequência por conta do clima de instabilidade econômica, reforçado pelo aumento da inflação e do desemprego. “Com essas ações, estamos conseguindo manter o nosso fluxo estável. Alinhado a isso, orientamos os lojistas a oferecerem descontos ou outros atrativos que possam estimular e efetivar as vendas”, explica Ricardo Baptista, Diretor-Presidente do Grupo Partage, em entrevista ao Mundo do Marketing.
Diante do período desafiador, a Partage congelou alguns projetos de construção de novos shoppings – principalmente por conta da dificuldade em atrair os lojistas – mas olha para o futuro com otimismo e não descarta a aquisição de equipamentos já abertos. “A economia no Brasil sempre foi uma montanha russa. Assim como ela cai rápido, a tendência é que a recuperação seja na mesma velocidade, pelo menos é o que vemos historicamente. Acredito que, para o fim do próximo ano ou começo de 2017, o cenário comece a mudar e tenhamos uma agenda mais positiva. Logicamente, isso depende do ambiente político, que não deve demorar a ser resolvido, já que em 2018 teremos eleições”, observa Ricardo Baptista.
Lumine quer estimular os empreendedores
Enquanto a maioria das empresas paralisou os novos projetos, a Lumine tem o desafio de atrair os lojistas para inaugurar no primeiro semestre de 2016 quatro empreendimentos. Um deles é o Cantareira Norte Shopping, em São Paulo, que já conta com 80% dos 27 mil metros quadrados de área bruta locável (ABL) já comercializados. O centro de compras contará com 220 lojas, seis lojas âncoras como Riachuelo, Renner, Casas Bahia, C&A e Besni, cinco megalojas, ampla praça de alimentação, cinco salas de cinema, área para games e uma academia, além de mais de 1.300 vagas de estacionamento. O mall atingirá cerca de 700 mil pessoas, de bairros como Perus, Jaraguá, Brasilândia, Pirituba e Freguesia do Ó, além das cidades de Franco da Rocha, Caieiras e Francisco Morato.
Nesta fase, antes de pensar em atrair os consumidores, a Lumine quer instigar os empreendedores. Para isso, a empresa oferecerá no próximo mês workshop com Renato Meirelles, Presidente do Instituto Data Popular, que falará sobre a nova classe média e oportunidades de negócios que se encaixam nos hábitos e nas exigências desse consumidor brasileiro. A iniciativa visa estimular os empresários da região, que podem levar suas marcas para o espaço em busca de crescimento, agregando valor ao equipamento de varejo. Além disso, a gestora também tem estimulado o empreendedorismo, incentivando a abertura de franquias e atraído grandes varejistas reconhecidos nacionalmente.
Com empreendimentos focados no interior do país, a Lumine tem construído espaços destinados a todos os públicos, já que, na maioria das vezes, os equipamentos são os únicos nas cidades. “Fazer um shopping para a Classe C, não é fazer um shopping diferente, mas um empreendimento localizado onde esse público está. O setor de shopping centers nas grandes capitais é mais segmentado por classe e tem um posicionamento melhor definido. Como temos negócios no interior, acreditamos em projetos mais democráticos, que atendam todos os públicos, com um variado mix de lojas”, comenta Marcelo Sallum Sócio-Fundador da Lumine, em entrevista ao Mundo do Marketing.
(Por Mundo do Marketing) varejo, núcleo de estudos e negócios do varejo, retail lab, ESPM, Shopping Center, Michel Cutait